quarta-feira, 25 de novembro de 2015

A Cega...

A névoa se dissipava ainda enquanto no vértice mais distante donde se observava o estranho espetáculo se podia notar uma forma justaposta ao fim do triângulo.
Chamava-se Mole, como poderá saber adiante, e constará ainda que era cantora, todavia, como miserável característica dessa nossa condição era tratada por "a Cega".
Os ouvidos ainda não ignoravam o estrondo de pouco antes quando sublimes sons eram enviados pelo ar por Mrs Mole.
Era um tipo de música diferente pois notava-se que nem todos os que haviam presentes a captavam da mesma forma. Era como se a canção tomasse uma forma antes de chegar à cada um... como se Mrs Mole soubesse como chegar à essência de cada coração com sua música.

Era, dentre o que podia assimilar pela silhueta, uma bela mulher; sentada empunhando um violão ou alaúde ou algo parecido, estava descalça e seus pés denotavam uma pele branca com a rigidez que lhe subjulgavam menos de 30 anos, em idade normal.
Difícil era precisar algo sobre aquela criatura pois o seu surrado vestido branco, embora todo desfigurado, insinuava que ela estivera presente à um casamento e que, por dedução intuitiva, fora uma bela noiva que ficou à esperar por alguém que não chegou. Essa espera pode ter levado até quatrocentos anos.

Tal imprecisão nesse lapso de tempo deve-se ao fato da impassividade na presença de Mrs Mole. Acima dos pés que trazia onde via-se o velho vestido, havia por detrás do instrumento, um colo juvenil que guardara prazeres e pecados ou ainda a porta da verdadeira perdição de algum malaventurado.
Tinha ao busto um descompasso no vestido que simulava um decote e recobria-se misteriosamente, dentre uma espécie de véu que fixava-se como que eternamente imóvel sobre um colar assemalhado à um escapulário, onde talvez algum sábio Rei houvesse impresso seus pecados e pedidos numa espécie de relicário e confiado à essa trovadora a guarda de sua perdição tal qual a redenção, como assim cabe aos que tem fé.

Seus braços e pescoço completavam o belo conjunto descrito contraponteados por belos e cacheados cabelos pretos, semi curtos, no iminência entre o curto e o comprido.
O rosto era angelical como que esculpido por algum Grego em homenagem à Vênus ou Afrodite, com uma precisão nos traços contrastantes com a mais inquietante e latente característica dessa mulher.
Mrs Mole tinha os olhos de um azul leitoso como que da cor dos portões do Éden; como que embebidos em nuves e petrificados como diamantes. De um brilho mórbido e melancólico; com uma aterrorizante vivacidade morta.

Junto aos seus lábios hipnóticos, ela seguia cantando e abrindo e fechando os olhos num desespero que parecia indicar que tentava ver algo à sua frente, como se tal o pudesse, como o óbvil mais rudimentar lhe quisesse saltar as órbitas adentro e algum Deus mitológico os barrasse com um arpão sobre as pupilas dessa ninfa.

Continua...

3 comentários:

Unknown disse...

Pronto! Agora vou olhar seu blog todos os dias para saber o que esse conto vai dar!
Beijos

C.K. disse...

Caro amigo, li vários de seus contos e divagações, exercícios fantásticos, muito especiais mesmo, combustível para muitas e muitas canções, poemas ou simplesmente inspirações.

Um grande abraço, estarei sempre passando por aqui.

Rica

Anônimo disse...

virei fã!!

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